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Miguel Freitas: “A atenção aos detalhes foi fundamental para alcançar os meus objetivos.”

Miguel Freitas é natural de Santarém, tem 51 anos e é alumnus da Escola Superior de Biotecnologia, da Universidade Católica Portuguesa – Porto. Vive em Nova Iorque há 20 anos e é vice-presidente dos Scientific Affairs da Danone, cargo que ocupa com muito empenho e paixão. Admite que o seu percurso “surgiu muito naturalmente”, fruto de muito trabalho e determinação. Nos tempos livres? Gosta de pastelaria e de fotografia analógica.

 

Vive em Nova Iorque há 20 anos. Gosta do ritmo acelerado da cidade?

Curiosamente, não. Mas gosto muito de Nova Iorque. Aliás, gosto muito de cidades grandes, mas, talvez, não pelo ritmo demasiado acelerado, mas sim pelas outras inúmeras oportunidades e possibilidades. Viver em Nova Iorque foi um desafio ao princípio, porque temos de saber equilibrar as diferentes dimensões do nosso dia. Aqui vive-se um ambiente de trabalho bastante intenso. É importante encontrar um equilíbrio. Como cá dizemos, é importante o work-life balance. Para quem cá vive: é um desafio que temos diariamente.

 

“Estava determinado em fazer parte do meu percurso no estrangeiro.”

 

Desde novo que desejou ter experiências internacionais. O que é que o fazia ter os olhos postos no estrangeiro?

Sou natural de Santarém. Cresci nesta pequena cidade, mas desde novo fui incentivado a desejar ir para fora para conhecer outras realidades e também comecei cedo a viajar. Sempre tive o incentivo da minha família. Muito naturalmente, acabei por ter como foco e vontade de ir para fora, porque percebia o benefício e a vantagem que isso iria ter na minha vida. Conhecer outras culturas, pensar mais além, abrir-me ao mundo tanto profissionalmente, como pessoalmente.

 

Foi com esse foco que acabou por escolher estudar na Escola Superior de Biotecnologia?

Exatamente. Entrei em 1990 e fui viver para o Porto. Na altura, a ESB proporcionava aos estudantes oportunidades internacionais e esse foi um dos meus critérios de escolha, juntamente com a minha paixão pela ciência e alimentação. Estava determinado em fazer parte do meu percurso no estrangeiro e percebi que era na Católica que ia conseguir concretizar essa vontade. Foi a Escola Superior de Biotecnologia que me lançou para uma vida na investigação, na vertente científica com foco na nutrição e alimentação. Acabei por ficar cerca de 7 anos, porque depois da licenciatura, também fiquei para o mestrado em Estudos Alimentares.

 

Quando é que surge o seu gosto pela área Alimentar?

Havia em mim uma clara tendência para a área das ciências. Venho de uma família de médicos e enfermeiros, embora nunca tenha pensado na medicina para a minha vida. Perspetivava, talvez, uma carreira na área da biologia, genética e biotecnologia. A Nutrição e a Alimentação surgiram, concretamente, com a licenciatura em Engenharia Alimentar. Foi uma descoberta que fiz na Universidade.

 

“O corpo docente de excelência e o ensino dinâmico foram elementos essenciais na minha formação.”

 

De que forma é que a Escola Superior de Biotecnologia lhe abriu portas para o futuro?

Precisamente pela abertura ao mundo e pelas oportunidades que coloca no caminho dos estudantes. O estágio que fiz na Suíça, na Nestlé, no âmbito da Licenciatura de Engenharia Alimentar, e o estágio que fiz em França na Danone, no âmbito do Mestrado, foram muito importantes para o meu percurso, porque foram experiências que abriram portas para um mundo de oportunidades. Para além disso, o corpo docente de excelência e o ensino dinâmico que privilegiava a prática e o desenvolvimento de projetos também foram elementos essenciais na minha formação.

 

Atualmente, é vice-presidente dos Scientific Affairs da Danone, nos Estados Unidos. Em que consiste a sua função?

O trabalho que a minha equipa desenvolve tem duas vertentes: a vertente externa e a vertente interna. Na vertente externa, trabalhamos na ligação entre a Danone e a comunidade médica e científica. Asseguramos a integridade do portefólio dos produtos da Danone no que diz respeito aos atributos de saúde. Trabalho como porta-voz nos campos da Nutrição e da Ciência para efeitos de relações públicas e convenções relacionadas com marcas e tópicos da categoria, como efeitos benéficos de probióticos. Na vertente interna, fazemos a ponte entre as nossas equipas científicas e o Marketing. Desenvolvemos as componentes de Nutrição e Saúde aplicadas às mensagens que são comunicadas, às alegações, a novas formas de comunicação e, também, em eventos destinados a profissionais de saúde e consumidores. No fundo, traduzimos as mensagens científicas de forma a que sejam devidamente comunicadas ao público, sem nunca perderem o rigor científico. Por exemplo, quando queremos comunicar um iogurte grego, existem mensagens concretas que têm de ser comunicadas. Qual a quantidade e a qualidade da proteína, de gordura e de minerais? Para isto, trabalhamos em cooperação com as equipas de Marketing e Jurídica.

 

Mas antes de ocupar esse papel, esteve numa função mais laboratorial e de investigação. Tem saudades?

Confesso que não, apesar de terem sido anos muito bons, onde trabalhei como líder de projetos de investigação, concretamente sobre probióticos. Foi precisamente sobre este tema o meu doutoramento, realizado no Instituto Nacional de Saúde e Investigação Médica, em Paris, em colaboração com a Danone. Apesar de ter sido uma oportunidade excelente e de ter gostado verdadeiramente daquilo que fazia, prefiro um trabalho que me ponha em contacto com o público e o meio científico e médico externo. A posição que ocupo atualmente permite esse contacto constante, seja através da interligação que faço com diferentes equipas e pessoas, seja porque é um trabalho que exige viajar muito.

 

De Santarém para o Porto, de Portugal para a Suíça, da Suíça para França e de França para os Estados Unidos da América. Como é que definiria o seu percurso?

Diria que o meu percurso foi muito natural. Não planeei muito, as oportunidades foram surgindo muito naturalmente. Mas, claro, que fui trabalhando para que as propostas pudessem surgir e mantive sempre o meu foco e determinação.

 

“O meu objetivo era mudar o que as pessoas consomem, através da investigação de probióticos e o efeito na saúde.”

 

Que conselhos daria aos mais jovens que estão neste momento a iniciar o seu percurso profissional também na área da Ciência?

Ser determinado, ter atenção aos detalhes e definir um sentido e um propósito. É muito importante ser-se determinado e ter-se um foco bem definido, porque é isso que permite avançar, chegar a resultados e não desistir das hipóteses levantadas. No meu doutoramento, foi essencial manter a determinação e a confiança na minha tese, porque era sobre um tópico controverso. A atenção aos detalhes é essencial para quem trabalha em ciência, porque o mais pequeno pormenor pode ser decisivo. Quer seja no laboratório a cultivar bactérias ou a escrever um artigo científico, a atenção aos detalhes foi fundamental para alcançar os meus objetivos. Por último, mas não menos importante, acredito que ter um objetivo e um propósito definidos ajuda a manter o foco e a tomar decisões acertadas. Depois de terminar o meu doutoramento, tive de optar por seguir uma carreira académica de investigação fundamental ou ingressar na Danone. Não foi uma decisão fácil, mas foi essencial não perder de vista o meu objetivo e o meu propósito que era, e continua a ser, ter um impacto direto na vida das pessoas e de melhorar a nossa saúde através da alimentação.

 

Através da investigação aplicada?

Sim, eu preferi focar-me na investigação aplicada, porque dessa forma conseguia ter um impacto no que as pessoas consomem e fazer a diferença no tipo de alimentação. O meu objetivo era mudar o que as pessoas consomem, através da investigação de probióticos e nos seus efeitos na saúde. Ter um propósito definido foi essencial para tomar decisões e permitir que novas oportunidades surgissem.

 

O que é que gosta de fazer nos seus tempos livres?

Pastelaria e fotografia analógica. A pastelaria é quase engenharia. Mexer um preparado 20 minutos é diferente de mexer 30 minutos e um grau a menos ou a mais pode fazer toda a diferença. Também gosto muito de fotografia analógica. Descobri esta paixão, porque o meu pai era radiologista. Em vez de ossos ou partes do corpo humano, eu experimentava em coisas mais normais (risos). Também aqui um segundo a mais ou a menos vai fazer toda a diferença na revelação e no produto final.

 

Mais uma vez, os detalhes …

Sim, sou muito atento e obcecado pelos detalhes.

 

25-05-2023